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Empresário Sebastião Figueiroa está no centro de investigações da PF em Pernambuco

Conhecido ‘Tão Figueiroa’ é irmão do ex-prefeito de Santa Cruz do Capibaribe, Toinho do Pará

Na manhã desta terça-feira (16), foi deflagrada a operação Casa de Papel no estado de Pernambuco. A ação foi da Polícia Federal (PF) em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU) e com o Ministério Público Federal (MPF) e apura irregularidades na compra emergencial de materiais médicos, em decorrência da pandemia do novo coronavírus.

Segundo a PF, há indícios de que a empresa contratada – AJS Comércio e Representações – pertence a um grupo econômico do setor gráfico, que estaria sendo beneficiado com contratos públicos milionários há mais de uma década.

Os contratos, feitos com dispensa de licitação, são das prefeituras de Recife, Olinda, Cabo de Santo Agostinho e Paulista. Juntos, eles equivalem a um valor aproximado de R$ 9 milhões. Foram cumpridos 35 mandados de busca e apreensão nessas cidades, tanto nas prefeituras quanto na sede da empresa AJS e nas residências de seus sócios.

De acordo com a delegada federal Andrea Pinho, a AJS é uma empresa de fachada: “Ela existe, mas não tem estrutura ou capacidade operacional para ser beneficiada com esses contratos milionários que foi favorecida. A sede operacional dela não fica no endereço registrado oficialmente. E quando chegamos à sede, vimos que tem uma estrutura bem precária para fazer frente a esses contratos”.

O quadro societário da empresa seria composto por dois laranjas. “Os sócios dela sequer tinham passaportes, nunca viajaram para o exterior, tem veículos de 2011 e moravam em locais que não seriam compatíveis para o capital social da empresa, que é de R$ 5 milhões”, explica.

Além disso, segundo a delegada, a empresa só teve dois funcionários nos últimos anos – um em 2015 e um em 2018. Eles são irmãos e trabalharam no gabinete do ex-deputado estadual Beto Accioly na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Ele pretende ser candidato à Prefeitura de Camaragibe e sua residência foi um dos alvos da PF nesta terça.

“Nós identificamos que essa empresa pertencia a um grupo econômico, voltado a área gráfica, que estava sendo favorecido por contratações milionárias há mais de uma década. Sempre contratos efetuados pelo governo do estado e diversas prefeituras”, exemplifica a delegada. Esse grupo seria composto pelas empresas Gráfica Única, Editora Canaã, Unipauta Formulários, Racs Comércio de Informática e a já mencionada AJS. Todas pertencem diretamente ou indiretamente a Sebastião Figueiroa de Siqueira – se não está no nome dele, está no de funcionários ou familiares. No entanto, o foco da investigação é tão somente os contratos da pandemia.

De acordo com a PF, a investigação constatou que boa parte dos recursos públicos recebidos era sacada em espécie, de forma fracionada, para não chamar a atenção dos órgãos de controle. Suspeita-se que o dinheiro vivo era utilizado para pagar propina a políticos envolvidos nas contratações.

“Além disso, a gente detectou que essas empresas remetiam valores milionários a outras empresas – fantasmas, de fachada ou laranjas – que não tinham a menor condição de realizar essas movimentações financeiras. Ou seja, mais um indicativo de lavagem”, discorre Andrea.

Os contratos com a Prefeitura do Recife equivalem a R$ 7,5 milhões. Já os de Olinda e Cabo de Santo Agostinho, R$ 600 mil. O de Paulista seria no valor de R$ 44 mil.

“Posteriormente, a gente descobriu outros contratos de verbas federais da pandemia, dessa empresa, com Jaboatão dos Guararapes e Primavera. E devem ter outras, porque está tendo um delay na inserção de dados municipais no portal Tome Conta”, alega Andrea.

A investigação ainda está no início – iniciou há um mês – e apura os crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, corrupção ativa e dispensa indevida de licitação. “Junto com a CGU, vamos verificar os indicativos de execução desses contratos e se foram pagas verbas. Porque se tudo tiver sido efetivamente entregue e pago, não há crime. Não estamos incriminando ninguém. Há uma situação nebulosa que estamos tentando esclarecer”, esclarece a delegada. “Crime só resta comprovado ao final do processo penal”, conclui.

Respostas

Em nota ao Diario, a Prefeitura do Recife esclarece que “as compras da AJS Comércio e Representação foram realizadas cumprindo todas as exigências da Lei 13.979/2020” e que “todos os processos foram enviados anteriormente por iniciativa da prefeitura ao Tribunal de Contas, Ministério Público Federal e, por solicitação, à Polícia Civil”.

“Os preços estão de acordo com os praticados no mercado e toda documentação exigida pela lei foi apresentada. Todos os materiais comprados já foram recebidos e estão em uso nas unidades de saúde da emergência da Covid-19. O valor total das compras realizadas e recebidas da empresa AJS foi de R$ 7,5 milhões. A prefeitura continua à disposição de todos os órgãos de controle para esclarecer o que for necessário e reafirma que todos os processos cumpriram as exigências legais”, pontua a PCR.

Também em nota, a Prefeitura de Olinda “reafirma a legalidade dos processos da Secretaria de Saúde”. O valor, no entanto, seria de R$ 282 mil. “Sendo que o material foi contratado no preço de mercado, foi efetivamente entregue e o valor da compra ainda nem foi pago. A prefeitura apoia toda forma de investigação e apuração e se coloca à disposição, não apenas da Polícia Federal, como também de todos os órgãos de fiscalização e controle”.

A Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho também informa valor diferente do citado pela PF – R$ 509 mil: “O Cabo, especificamente, efetuou compras de EPIs e enxoval hospitalar, observando os valores praticados no mercado. Todo o processo de aquisição dos produtos foi de acordo com a Lei 13.979/2020 e não houve prejuízos aos cofres públicos. Todo o material já foi recebido e vem sendo utilizado no combate à Covid-19 nas unidades de saúde do município, bem como nas ações preventivas”. Por fim, o município “reitera que está à disposição dos órgãos de controle para quaisquer esclarecimentos”.

A Prefeitura de Paulista também informa valor distinto do mencionado pela PF: R$ 40 mil. “O referido contrato foi realizado dentro dos parâmetros legais para aquisição de máscaras, álcool em gel, álcool etílico a 70° e luvas para proteger os gestores das 65 escolas municipais durante a entrega do kit alimentação em substituição à merenda escola. A equipe da Polícia Federal que esteve na Secretaria de Educação pode constatar parte do material adquirido e o planejamento de distribuição de outra parte deste material para as escolas”, diz a nota.

A Prefeitura de Jaboatão esclareceu que “não foi alvo” da operação e que “em 23 de março, a Secretaria de Educação adquiriu máscaras de proteção para os servidores que trabalham na distribuição de kits de alimentos para os alunos. A compra para pronta-entrega foi realizada por cotação em virtude do pequeno valor de R$ 15 mil. Todas as informações constam no Portal da Transparência”.

O ex-deputado Beto Accioly afirma que a ação da PF em sua casa “não possui qualquer relação com atos praticados” por ele. “O que existe é uma investigação em curso que apura suspeita de contratações superfaturadas realizadas pelas prefeituras do Recife, Olinda, Paulista e Cabo de Santo Agostinho. Cabe destacar que não possuo qualquer relação com a empresa nem com as prefeituras investigadas. Em 14 anos de vida pública, meu trabalho sempre se pautou pela responsabilidade e respeito ao erário público”, acrescenta.

“Manifesto total respeito e confiança no trabalho das autoridades competentes para esclarecimento dos fatos, que é de total interesse meu e de toda a população. Lamento que adversários políticos explorem o fato inventando mentiras descabidas, distorcendo a realidade para me atingir com o único propósito de afetar minha reputação às vésperas da eleição e prejudicar a pré-candidatura a prefeito de Camaragibe”, conclui Beto.

Por fim, a reportagem também procurou a Prefeitura de Primavera, a empresa AJS Comércio e Representações e Sebastião Figueiroa de Siqueira, mas não obteve retorno até a conclusão desta reportagem.

Diário de Pernambuco

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